Mais um dia de visita à Brinquedoteca Indianópolis vai acontecer. O ambiente já está preparado e pronto para receber as crianças.
Escuto o barulho do ônibus. Meus amigos do brincar chegaram. Caminho em direção ao portão para auxiliar na entrada das crianças. É o meu primeiro Contato com Eles.
Antes de brincar, faço a minha apresentação e fazemos um “combinado” para posteriormente guardarmos os brinquedos. Começo com um “olá”, quase ninguém se manifesta. Então pergunto:
- Quem quer brincar?
Aí sim, ouço vários “eu”, acompanhados de bracinhos levantados. Nesse momento percebo que estamos falando a mesma linguagem.
Começam a brincar e eu acompanho só observando, doidinha para juntar as crianças e fazer alguma atividade dirigida .Paro e lembro do que aprendi no curso sobre o brincar livre e o perfil da brinquedista e esqueço o meu lado professora. Continuo querendo brincar.
Nesse momento, para minha felicidade, um menino me diz:
- Tia, quer jogar?
Já sentando, eu pergunto quem começará e começo a distribuir as peças. Antes que eu continuasse, ele segurou a minha mão e disse:
- Não é você que dá, sou eu!
Novamente me recordo do curso “Na brinquedoteca os papéis são trocados, o centro das atenções é a criança; a brinquedista é a ouvinte”. Ele ganhou a partida e eu ganhei um amigo.
Logo depois, dirijo-me ao parque. No meio do caminho, uma linda menina me indaga:
- Tia, me ajuda a vestir a fantasia da Cinderela?
E eu de imediato respondo:
- Claro Cinderela!!!
Ela sorri. Aproveito a oportunidade e coloco uma peruca vermelha e uns adereços. Olho para ela e digo:
- Oi Cinderela, eu sou a princesa, vamos brincar?
Ela me olha por inteiro, um olhar reprovador e diz:
- Você não pode ser princesa, porque você é gorda!
Ajoelho, olho dentro dos olhos dela e digo:
- Mas como não? Se meu pai é rei, eu sou princesa.
Ela levantou os olhos, para o lado esquerdo (pensando) e respondeu:
- Tá bom, mas depois você vai ter que “esmagrecer”.
Eu sigo com meu pensamento “as crianças fazem parte da sociedade que tem como padrão de beleza a magreza e crescem priorizando esses valores, levando muitas vezes uma vida de frustrações por não estarem enquadradas nesse padrão ou por não acharem que estão”.
Ao chegar no parque um menino pequeno está sentado sozinho, brincando com um carrinho sobre a mesa. Eu sento em frente a ele sem falar nada. O menino me olha ressabiado e eu dou uma piscada de olhos. Ele levanta e sai. Penso em voz alta “isso que eu chamo de contato visual, mal sucedido”.
Nesse momento, uma menina grita da balança:
- Tia, me empurra!?
Eu me posiciono e começo a empurrar a balança. Vai e vem, vai e vem, num balanço sincronizado. De repente me deu vontade e comecei a cantar uma música. Ouço a voz – não tão terna – pedindo a mim:
- Dá pra você parar de cantar?
Era a menina que me pedira para balançá-la. E eu com uma imensa vontade de rir, em silêncio concedo seu pedido, acenando positivamente com a cabeça.
Está na hora do lanche, estendo a toalha xadrez no chão para fazermos um piquenique.
As crianças ficam surpresas e falam:
- Que legal, um piquenique!
Lancham rapidamente para continuarem a brincar.
A brincadeira recomeça. Volto a caminhar pela brinquedoteca. Dois meninos passam com revólveres feitos de lego. Um deles olha pra mim e faz pá, pá, pá... Mais uma vez o curso vem a minha mente “na brinquedoteca não deve haver armas de brinquedo; no entanto, se a criança pegar um brinquedo e usá-lo como arma, não podemos privá-la, pois há uma necessidade dela vivenciar tal situação por viver alguma situação parecida, por simples curiosidade ou para entender uma situação qualquer. Enfim, é preciso deixá-la suprir tal necessidade". Sendo assim, eu “morri”.
É chegada a hora do “desbrincar”. Ao seu modo, todos colaboram com a arrumação dos brinquedos. A professora reúne a turma na entrada e eu começo a carimbar a mãozinha de cada um deles para que levem uma recordação da brinquedoteca.
O ônibus chega. É hora de ir embora. Da porta, despeço-me deles e cada mãozinha retribui ao meu aceno, eles partem, mas fica a sensação do dever cumprido. Agora é só esperar pela próxima visita...
Dora Amorim
Escrevi esse texto baseado em algumas vivências(em dias diferentes) que tive com as visitas escolares. Para saber informações do curso de organização de brinquedotecas e formação de brinquedistas clique aqui.
De baixo para cima: Paulinha, Dora e Grace
Compartilhamos momentos divertidos, cada uma seguiu seu rumo, mas a alma de brinquedista permance viva em cada uma de nós.
Saudades amigas!